Capítulo
3
─
Despacha-te! Estou à tua espera há duas horas aqui no carro… - a voz da Júlia
soava aborrecida do outro lado do telemóvel.
─
Exagerada, só estás à espera há dez minutos e já estou a descer.
Saí
do quarto apressada, dei um tchau aos meus pais que estavam instalados na sala
a ver um qualquer programa de TV de animais estranhos.
Passei
a porta e vi Júlia sentada no carro à minha espera. Dei uma risada alta, corri
até ao carro e bati no vidro da janela. Abri a porta, entrei e agarrei-me a ela
aos beijos. Beijei-lhe todo o rosto como que pedindo desculpa pelo atraso.
─
Gatinha assim não vale, olha que eu apaixono-me. – ela falou e deu-me um
selinho rápido.
─
Vale tudo menos apaixonar, minha gostosa. – lancei-lhe um olhar malicioso,
sabendo que ela compreendia as minhas palavras.
─
Isso é a sério La? – mordeu o lábio inferior sabendo que aquilo não me era
indiferente.
─
Pára com isso e vamos logo. – cortei o clima de sedução.
─
Podemos ir ao Gritus?
─
Deve estar cheio, mas ok vamos.
Júlia
fez-me uma careta e seguiu até ao bar. Durante o curto caminho pensei em como
seria bom que a Fernanda estivesse ali comigo. Fui chamada de volta à realidade
com a Júlia a cantar alto e desafinado uma música qualquer que eu desconhecia.
Troquei de rádio só para a ver irritada e funcionou.
─ Idiota.
─ Também
te amo chata. Estavas a cantar muito desafinado, tive de fazer alguma coisa
pela saúde dos meus tímpanos.
Ela voltou
a colocar na rádio em que estava e cantarolou de novo, mas desta vez de forma
mais contida para minha alegria. Não demorou muito e logo chegámos ao Gritus. Como era esperado estava cheio,
a esplanada estava apilhada de gente. Agradeci mentalmente por a Júlia ter
contactos que nos guardavam sempre uma mesa. Depois de arranjarmos lugar para
estacionarmos o carro, saímos e fomos para o bar.
A Júlia
puxou-me pela mão e fomos na direcção da nossa mesa. A Paolla acenou-nos da
mesa. Ela guardava-nos lugar sempre que a Júlia informava que íamos ao Gritus. A Júlia cumprimentou-lhe com
dois beijos e logo a seguir eu fiz o mesmo. Eu achava a menina bonita, bem
loirinha, baixinha, de olhos claros, ar angelical. Mas eu acreditava que entre
ela e a Júlia se passava algo, pelo menos o olhar da loirinha mostrava um
interesse para além da simples amizade.
Deixei que
a conversa delas rolasse, talvez a Júlia finalmente acertasse no amor. O
empregado do bar passou por mim e pedi três cervejas, bem geladas. Talvez fosse
o empurrãozinho que as duas mulheres ao meu lado precisassem.
─
Obrigada. – agradeci pelas cervejas e comecei a beber.
Bebi
sucessivas cervejas sem notar o quanto já tinha exagerado. Vi a Paolla
levantar-se e despedir-se de nós, ainda não tinha sido o momento ideal para as
duas.
─
Medrosa. – provoquei.
─ La…
─ Sou eu. –
fiz-lhe uma careta.
─ Vamos
dançar?
─ Vamos,
dá-me uma ajuda.
─ Caramba
Larissa, não acredito que já estás assim. Fraquinha. – desta vez foi ela que me
provocou.
─ Cala a
boca e vamos logo.
O bar
tinha uma pequena pista de dança, que naquele momento já estava cheia. O que
significava que os encontrões eram muitos e sucessivos. Puxei a Júlia para
perto de mim e comecei a dançar agarrada a ela. A proximidade dos nossos corpos
provocava em mim o desejo de beijá-la, agarrá-la, tê-la toda para mim.
Olhei no
fundo dos olhos dela, o mundo à volta não existia para mim. Era o que acontecia
sempre que ingeríamos álcool em excesso, a cumplicidade tornava-se bastante
visível, tal como o desejo. Rocei os meus lábios de leve nos dela. Afastei-me
propositadamente e olhei para os olhos dela. Dei um selinho demorado e Júlia
não demorou a aprofundar o beijo. Pouco depois de termos começado o beijo,
alguém veio contra nós com tanta força que fomos separadas.
Olhei
atordoada para o ligar de onde tinha vindo toda aquela força destrutiva e ali
estava ela parada e a olhar para mim.
─
Desculpa, foi sem intenção Larissa. Alguém me empurrou e eu acabei a ir contra
vocês.
Olhava
para ela com a maior cara de idiota que podia ter. Boca aberta, olhos
esbugalhados e com uma confusão impressa neles.
─ Hmm,
tudo bem. Está tudo bem. – respondi-lhe rápido depois de voltar a um estado
considerado minimamente normal e não apático como estava anteriormente. –
Júlia?
Olhei em
várias direcções tentando encontrar a Júlia.
─ Estou
aqui. É ela? – a voz da Júlia soava ao meu ouvido vinda de trás de mim.
Acenei um
sim com a cabeça para que ela percebesse que sim. Era ela.
─ Vai lá
ter com ela sua anta, eu vou buscar bebidas para nós e vou demorar. – desta vez
tinha gritado ao meu ouvido deixando-me quase surda.
Ganhei
coragem e avancei até ela.
─ Olá
Fernanda. Desculpa ter-te ignorado há bocado. – falei-lhe bem próximo do
ouvido.
─ Olá
Larissa. Não tem problema e desculpa por ter ido contra vocês. Não queria ter
interrompido nada. – depois de ela me dizer aquilo, pensei no que ela agora
sabia sobre mim.
A Fernanda
percebeu que eu fiquei sem jeito e eu pude reparar num sorrisinho que lhe
escapava sem ela conseguir conter.
─ Sobre o
que eu vi… Relaxa, não vejo mal algum nisso. Vamos dançar Larissa?
Concordei
com a cabeça, estava visivelmente em choque por ela aceitar tudo. No fundo,
isso trazia-me pequenas doses de esperança. Esperança que ela também gostasse
de mulheres, o que seria bastante provável sendo que aquele bar era um bar simpatizante
para com a comunidade LGBT. Mas algo dizia para não criar expectativas em
relação a isso.
Senti ela
puxar-me para mais perto dela, o roçar dos corpos era inevitável. Controlei-me
para não a agarrar ali mesmo. Sentia uma onda de desejo percorrer-me todo o
corpo. Afastei todos os pensamentos de desejo e continuei a dançar.
Não sei
quanto tempo dançámos e só naquele momento me lembrei que a Júlia nunca mais
apareceu com as bebidas. Quem sabe se ela tinha encontrado uma menina e já
tinha ido embora com ela.
─ Tenho de
ir procurar a Júlia para irmos embora. – cheguei bem perto do ouvido da
Fernanda e encostei o meu corpo no dela na esperança que ela não recuasse e eu
pudesse sentir o seu corpo pelo menos durante uns curtos segundos.
─ Eu vou
contigo.
─ Ah! Não
é necessário Fernanda. Obrigada pela gentileza. – sorri-lhe tentando demonstrar
agradecimento.
─ Não
queres ir connosco à discoteca? Temos espaço para mais uma no carro.
─ Não,
obrigada. Amanhã levanto-me cedo e de qualquer das maneiras a Júlia não tinha
lugar, então fica para a próxima. – levanto-me cedo, sim, como se isso fosse
verdade.
Depositei-lhe
um beijo no rosto e virei-me para ir à procura de Júlia. Senti a Fernanda
puxar-me de volta e beijar o meu rosto com uma delicadeza que não esperava. Ruborizei.
Dei graças por estarmos num local escuro que não dava para ela notar isso.
Sorri-lhe e saí à procura da Júlia.
Encontrei-a
sentada no balcão do bar a falar com uma garota qualquer que eu não conhecia.
Não queria interromper, mas queria muito ir para casa.
─ Júlia,
eu vou para casa. Só te vim dizer para não esperares por mim.
─ Eu vou
contigo Larissa.
─ Tens a
certeza.
Ela
olhou-me com olhos de cachorro pidão e percebi que a conversa com a garota não
estava a ser agradável. Esperei que ela se livrasse da garota chata e puxei-a
pelo braço na direcção da saída.
─ Aquela é
a gatinha que te deixou de queixo caído? – Júlia perguntou deixando
transparecer uma leve pontada de ciúmes.
─ É.
– olhei para ela com ar culpado.
Não queria que
ela se sentisse mal com isso, nem a queria magoar. Tinha trocado a noite com a
Júlia para dançar com a Fernanda. Eu mal a conhecia, praticamente nunca tinha
falado com ela.
─ Desculpa
Júlia. Não devia ter-te deixado sozinha para estar a dançar com ela. – fui
sincera no pedido de desculpas.
─ Não te
preocupes com isso, está tudo bem. Mas para a próxima diz para ela trazer
alguma gatinha para eu dançar também. A garota do bar estava a deixar-me com
sono. Achava que nunca mais me ia largar.
─
Combinado. – ri-me da lata dela ao pedir uma gatinha para ela.
Voltámos para
o carro e ela foi deixar-me em casa. Fui deitar-me com a Fernanda na cabeça e
sonhei safadezas a noite toda com ela.
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